Universidade Federal do Rio de Janeiro
Escola de Comunicação
Linguagem Audiovisual 2
Prof. Consuelo Lins
2013/2
1.
O cinema direto revisitado.
Das origens nos anos 60 ao documentário
brasileiro contemporâneo. Observar a realidade sem intervir, neutralizando
indícios mais explícitos da presença da equipe na imagem - o ideal é a equipe
filmar tal como “uma mosca na parede”, quase imperceptível. Independentemente
das críticas feitas às premissas dessa não-intervenção, o Cinema Direto renovou
as bases do documentário e abriu inúmeras possibilidades para a prática
documental. Nos filmes inspirados nessa forma de
abordagem, o tempo conta, produz efeitos, provoca mudanças nas relações entre
cineastas e personagens, e também transformações na vida daqueles que são
“observados”.
Seleção de
seqüências dos filmes: Primárias (1960) e Crise (1963), de R. Drew; Grey Gardens
(1975), David e Albert Maysles. Futebol (1998), Nelson Freire (2003) e Entreatos (2004), de João Salles. Juízo (2007), de
Maria Augusta Ramos.
Bibliografia:
·
B. Nichols. ‘Que tipos de documentários existem?, in Introdução ao documentário. São Paulo:
Papirus, 2005.
·
J. Salles. “Sobre senadores que
dormem. A invenção do cinema direto”, in DVD Primárias.
·
S. Da-Rin. “Uma testemunha discreta”, in Espelho partido, tradição e transformação do documentário
cinematográfico. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2004.
·
C. Lins, C. Mesquita. Filmar o Real. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2008.
2. O cinema verdade revisitado.
Das origens
desse movimento nos anos 50/60 ao cinema de Eduardo Coutinho. É o cinema da
interação, do encontro, da negociação, do diálogo. Um cinema que aposta na
participação explícita da equipe e “joga a mosca na sopa”, às claras, e o filme
só se realiza a partir dessa intervenção. Jean Rouch inventa a noção de
“cine-transe” para descrever a transformação que acontece com todos os
implicados durante processo de filmagem e é isso que ele quer filmar: “...nosso momento de verdade é
quando o olho está na câmera, é um momento de uma singular metamorfose para
quem filma e para quem é filmado (...). De repente, graças à câmera, ninguém é
mais o mesmo.”
Seleção de
seqüências dos filmes: Crônica de um
Verão (1960), de J. Rouch e E. Morin;
Cabra Marcado para morrer (1964/1984), Babilônia
2000 (2001), de Eduardo Coutinho, O
tempo e o lugar, de Eduardo Escorel (2008).
Bibliografia:
·
C. Lins. “Cabra Marcado
para morrer: um novo modo de se fazer documentário”, in O cinema de Eduardo Coutinho. Cinema,
televisão e vídeo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004.
·
J. C. Bernardet. “Vitória sobre
a lata de lixo da história”, in Cineastas
e imagens do povo. São Paulo: Cia das Letras, 2003.
·
________________. “A entrevista” in Cineastas e imagens do povo. São Paulo: Cia das Letras, 2003.
·
S. Da-Rin. Verdade e Imaginação, in Espelho partido, tradição e transformação do documentário
cinematográfico. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2004.
·
F. Ramos. “Cinema Verdade no
Brasil”, in F. E. Teixeira (org.), Documentário
no Brasil. Tradição e transformação. São Paulo: Summus Editorial, 2004.
·
__________. Mas afinal... o que é mesmo documentário?.
São Paulo: SENAC, 2008.
3. Documentário brasileiro em três tempos: Opinião Pública (1966), de A. Jabor, Retrato de Classe (1977), de Gregório
Basic, Edifício Máster (2001), de
Eduardo Coutinho: a classe média vai ao paraíso.
As classes
médias constituem um universo pouco abordado pelo documentário brasileiro, ao
contrario da ficção. Análise da produção documental brasileira iniciada com o
Cinema Novo através dos deslocamentos que os filmes produzidos nas décadas
seguintes impuseram a essa tradição.
Bibliografia:
·
J. C. Bernardet. “Opinião Pública: o espelho perturba o método”, in
J. C. Bernadet, in Cineastas e imagens do
povo. São Paulo: Cia das Letras, 2003.
·
C. Lins. “Opinião Pública
(1966), de A. Jabor, Retrato de Classe
(1977), de Gregório Basic, Edifício
Máster (2001), de Eduardo Coutinho: a classe media vai ao paraíso”, in Interseções, Revista de Estudos
Interdisciplinares, Dossiê Cinema e Ciências Sociais, Programa de
Pós-Graduação em Ciências Sociais – UERJ. Rio de Janeiro: UERJ, 2003.
·
C. Mesquita. “Outros Retratos –
ensaiando um panorama do documentário independente no Brasil”, in Rumos Cinema e Vídeo – Fazer Documentários.
São Paulo: Itaú Cultural, 2007.
·
Xavier. O cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
4. A invenção do cinema
“subjetivo” no campo do cinema documentário: diários fílmicos, cartas fílmicas,
filmes ensaísticos, filmes autobiográficos.
A produção
documental marcadamente "subjetiva", através da discussão das opções
éticas, estéticas e técnicas que atravessam um determinado corpus de filmes
tendo como principais questões a problematização de noções que constituem essa
produção - autobiografia, biografia, sujeito, "primeira pessoa"-, as
interseções entre as esferas pública e privada, as tensões entre história e
memória e os dispositivos de filmagem colocados em cena pelos cineastas para
estabelecer relações com eles mesmos, com o mundo e com o espectador. Ao invés
de filmar outros corpos, outros gestos, outras visões de mundo, ao invés de
filmar o "outro" e se manter à distância do universo filmado -
pilares da tradição do documentário - a questão agora, para muitos cineastas, é
registrar o que lhes é familiar - mesmo que, em muitos casos, estranhamente
familiar.
Seleção de
seqüências dos filmes: Lost Lost Lost
(1975), de Jonas Mekas; A catadora e os
catadores (2000), de A. Varda, Passaporte
húngaro (2002), de Sandra Kogut, 33 (2003), de Kiko Goifman.
Bibliografia:
·
M. Renov. “Investigando o sujeito: uma introdução”, in Mourão, M. D.
e Labaki, A. (ogs) in O cinema do real.
São Paulo: Cosacnaify, 2005.
·
P. Bourdieu. “A ilusão biográfica, in Ferreira, M. E Amado, J.
(orgs) Usos e abusos da história oral.
Rio de Janeiro: Edição Fundação Getúlio Vargas, 1998.
·
P. Dubois. “A foto-autobiografia”. In: Revista Imagens.
Campinas : Ed. Unicamp.
·
M. Renov. “Lost, Los Lost:
Mekas as Essayist”, in Subject of
documentary. University of Minesota Press, 2004.
·
A. Astruc. “Nascimento de uma
nova vanguarda: a “câmera-stylo””, in Nouvelle
Vague. Lisboa: Cinemateca Portuguesa, Museu do Cinema, 1999.
·
J. C. Bernardet. “Documentário
de busca: 33 e Passaporte Húngaro”, in M. D. Mourão e A. Labaki. (ogs) in O cinema do real. São Paulo: Cosacnaify,
2005.
·
C. Lins. “Um passaporte húngaro, de Sandra Kogut: cinema político e
intimidade”. Galáxia numero 7,
Revista Transdisciplinar de Comunicação, Semiótica, Cultura. Programa de
Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica da PUC/SP.
4. 1 O ensaio fílmico
Os ensaios
fílmicos de Orson Welles, Chris Marker e Agnès Varda nos ajudam a pensar as
opções do documentário brasileiro contemporâneo e particularmente a vislumbrar
novos usos para a narração em off. Se o ensaio é, como afirma Adorno, uma forma
literária que se revolta contra a obra maior e resiste à idéia de “obra-prima”
que implica acabamento e totalidade, podemos pensar que é contra a maneira
clássica de se fazer documentário que os filmes ensaísticos se constituem. São
filmes em que essa “forma” surge como máquina de pensamento, meio de uma
reflexão sobre a imagem e o cinema, que imprime rupturas, resgata
continuidades, traduz experiências.
Seleção de
seqüências dos filmes: Salut les cubains
(1963) e Ulysse (1983), de A. Varda,
Seams (1997), de Karin Ainouz, Santiago, uma reflexão sobre o material
bruto (2007), de João Moreira Salles, Rocha que voa (2002), de Eryk Rocha.
Bibliografia:
·
A. Bazin. “Chris Marker” in Le cinema français de la liberation à la
Nouvelle Vague. Paris, Cahiers du Cinéma, 1998, pp. 257/260.
·
A. Machado. O filme-ensaio. Concinnitas, Rio de Janeiro, v. 4, n. 5,
p. 63-75, 2003. www.intermidias.com/txt
/ed56/Cinema_O%20filmeensaio_Arlindo%20Machado2.pdf
·
C. Delvaux. “A escavação nas
estratificações de uma imagem-múmia”, in Catálogo
da retrospectiva Agnes Varda, o movimento perpétuo do olhar. RJ/SP: CCBB,
2006.
·
C. Lins. “O ensaio fílmico e a narração em off”, in F. Morais, G.
Bragança, (orgs) O som no cinema. Rio
de Janeiro: Caixa Econômica Federal, 2008.
. C. Lins, Rezende, L., França, A. A noção de documento e a apropriação de imagens de arquivo no documentário ensaístico contemporâneo.http://revistas.pucsp.br/index.php/galaxia/article/view/5597/0
. C. Lins, Rezende, L., França, A. A noção de documento e a apropriação de imagens de arquivo no documentário ensaístico contemporâneo.http://revistas.pucsp.br/index.php/galaxia/article/view/5597/0
·
C. Delvaux. “A escavação nas estratificações de uma imagem-múmia”,
in Catálogo da retrospectiva Agnes Varda, o movimento perpétuo do olhar. RJ/SP:
CCBB, 2006.
·
A. Varda. Entrevista in Catálogo da retrospectiva Agnes Varda, o
movimento perpétuo do olhar. RJ/SP: CCBB, 2006.
·
A. Omar. “O
anti-documentário, provisoriamente, in Cinemais n. 8.
·
G. Ramos. "O
documentário como fonte para o experimental no cinema de Arthur Omar", em Documentário no
Brasil: tradição e transformação (Org. Francisco
Teixeira). Summus Editorial.
4.2 Filme de família e documentário.
O que é um filme de família? Trata-se, segundo Roger Odin, de um filme
amador realizado por um dos integrantes de uma família “sobre personagens ou
acontecimentos ligados, de uma maneira ou de outra, à história dessa família”.
Um material cada vez mais utilizado em diversos campos da produção audiovisual,
desde instalações de arte contemporânea aos programas televisivos. O
documentário, no entanto, é o domínio por excelência de uso desse material.
O “filme de família” sofreu grandes transformações nos últimos 20 anos,
tanto em função do barateamento das tecnologias de captação de imagem quanto
das mudanças entre as esferas pública e privada na sociedade contemporânea. Se
durante muitos anos essa produção amadora se concentrou em filmar os momentos
“felizes” das famílias, hoje não são poucas as produções dominadas por uma
espécie de “lógica do pior”, nas quais o que se quer é revelar os piores
momentos de uma família, os mais constrangedores, humilhantes, sórdidos, em
busca de fragmentos de visibilidade midiática.
Querendo ou não, o documentário faz parte dessa realidade, fruto da
intensificação de um processo de retração da vida pública cujas origens
remontam a meados do século XIX. Trata-se da consolidação do que Richard Sennet
chamou de “ideologia da intimidade”, que tem tido efeitos devastadores na
esfera política. Como o documentário tem lidado com esse ‘estado de coisas”?
Seleção de trechos dos
filmes de Peter Forgács, e ainda
de Tarnation (2003) Jonathan Caouette (88’); Na captura dos
Friedmans (2003), de Andrew Jarecki (107’) e Pacific (2010), de Marcelo Pedroso.
Bibliografia:
·
R. Odin: "As
produções familiares de cinema e vídeo na era do vídeo e da televisão", in
Cadernos de Antropologia e Imagem, volume 17, nº 02. Rio de Janeiro:
UERJ, 2003.
·
R. Sennett. O declínio
do homem público: As tiranias da intimidade. S. Paulo: Companhia das
Letras, 2001.
·
C. Lins, T. Blank. "Ruínas da intimidade: os "objetos
encontrados" por Peter Forgács." O cinema de Peter Forgács -
Arquitetura da Memória. São Paulo: CCBB, 2012, v. , p. 102-109.
·
P. Rebello
(org.) O cinema de Peter Forgács - Arquitetura da Memória. São Paulo: CCBB, 2012. (catálogo da mostra)
5. Impressão de realidade e “efeito de real”
no cinema documental: o cinema reflexivo e o questionamento das fronteiras
entre ficção e documentário.
Seleção de sequências dos filmes: Aconteceu
perto da sua casa (1992), de R. Delvaux; Verdades e Mentiras
(1973), de Orson Welles; Mato eles?
(1983), de Sergio Bianchi; Close Up (1990), de A. Kiarostami,
Salve o Cinema (1995), de Mohsen
Makhmalbaf, Agarrando Pueblo (1978),
de Luis Opina, e Jogo de Cena (2007),
de Eduardo Coutinho.
Bibliografia:
·
Abbas Kiarostami e Youssef Ishaghpour. Abbas Kiarostami. São Paulo: Cosac & Naif, 2004.
·
França. M. Lisssovski. “A
tirania do mundano”, (sobre Close up), in Cinemais.
·
Jaguaribe. O choque do real. Rio de Janeiro: Rocco,
2007.
·
Nichols. Introdução ao
documentário. São Paulo: Papirus, 2005.
·
Xavier. “O cinema-discurso e a desconstrução”, in O Discurso Cinematográfico: opacidade e transparência. São Paulo:
Paz e Terra, 2005.
·
Lins. “Salve o Cinema”, in Cinemais
1998.
·
_________. “Documentário: uma
ficção diferente das outras?”, in Ivana Bentes (org.), Ecos do Cinema, de Lumière ao Digital. Rio de Janeiro: UFRJ, 2007.
·
Lins & Mesquita. Crer, não crer, crer apesar de tudo: a
questão da crença nas imagens na recente produção documental brasileira. Texto
apresentado no encontro da Compós em 2008.
(http://www.compos.org.br/pagina.php?menu=8&mmenu=0&fcodigo=383)
·
Eduardo Escorel. “A direção do
olhar” in Adivinhadores de água. São
Paulo: Cosacnaify, 2005.
·
Gilles Deleuze. “As potências do falso”, in A Imagem-Tempo. Rio de Janeiro: Brasiliense.
·
J. C. Bernardet. Caminhos de
Kiarostami. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
·
S. Da-Rin. Espelho partido, tradição e transformação do
documentário cinematográfico. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2004. (os
dois capítulos sobre cinema reflexivo)
·
João Luiz Vieira. Câmera-faca: o
cinema de Sérgio Bianchi. Santa Maria da Feira:Editora do Festival
Luso-Brasileiro, 2005.
·
R. Stam. “Homo-Ludens. O gênero auto-reflexivo no Romance e no Filme”,
in O espetáculo interrompido. São
Paulo: Paz e Terra, 1981.
6. Discussão a partir do livro Filmar o
real: sobre o documentário brasileiro contemporâneo, de Consuelo Lins e Cláudia
Mesquita. Exibição de trechos de filmes citados.
Textos em anexo:
·
J. C. Bernardet. “O modelo
sociológico” e “A entrevista” in
Cineastas e imagens do povo. São Paulo: Cia das Letras, 2003.
·
C. Lins. “Bernardet e seus
espectros”, in Neto, S. (org), Cineastas e imagens do povo. RJ, CCBB, 2010.
·
Hamburger, E. “O modelo
sociológico”, in Neto, S. (org), Cineastas e imagens do povo. RJ, CCBB, 2010.
·
_______. “O filme dispositivo no documentário
brasileiro contemporâneo”, in Sobre fazer
documentários. SP, Itaú Cultural, 2007.
·
F. E. Teixeira. “Documentário
expandido – Reinvenções do documentário na contemporaneidade”, in Sobre fazer documentários. SP, Itaú Cultural,
2007.
·
________________. “Documentário
moderno”, in F. Mascarello (org) História
do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2006.
Avaliação:
1. Duas provas, uma no meio do semestre, uma no final.
2. Seminário, com apresentação em sala e trabalho escrito.
3. Assiduidade, leitura dos textos e participação nas aulas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário